Já em cartaz no Centro da cidade de São Paulo, ‘Além, Muito Além do Zé do Caixão‘ é uma exposição que traz não só material inédito sobre o icônico personagem de filmes de terror Zé do Caixão, como busca resgatar facetas menos conhecidas de seu criador, o ator e diretor José Mojica Marins (1936 – 2020). “A minha geração, por exemplo, conheceu o Zé como um cara de programa de auditório, uma coisa meio caricata, daquela figura com as unhas grandes. Não era todo mundo que sabia que o cara tinha feito mais de 100 produções”, explicou o curador da mostra, Marcelo Colaiacovo.
Em sua extensa carreira, que começou na década de 1940, além do terror, o paulistano Mojica dirigiu e atuou em filmes de faroeste, aventura, dramas sombrios (noir) e comédia. “Tem filmes de sexo explícito, que a gente deixou mais para o segundo andar, uma coisa mais 18 anos”, comentou Colaiacovo sobre a organização da mostra, onde podem ser vistos cartazes dos filmes, objetos cênicos, trechos de algumas produções e colagens inéditas.
Boca do Lixo
Para recontar a história de Mojica, Colaiacovo está resgatando também a história da chamada Boca do Lixo, área da região central paulistana que foi um polo de produção cinematográfica, principalmente entre as décadas de 1950 e 1980. Junto com sua sócia e companheira, Renata Forato, reabriu o Bar Soberano, que era ponto de encontro dos artistas à época. “O pessoal chegava aqui com um roteiro, e as produções eram formadas na mesa do bar. Atrizes escolhidas, eletricistas, maquinistas, era um lugar bem democrático”, conta sobre o espaço que foi reaberto próximo à Estação da Luz e à chamada Cracolândia.
“A gente não teria como acessar esse lugar se ele não tivesse tão degradado. A gente fez uma parceria independente com o antigo proprietário, porque era um lugar que, para ele, não valia a pena”, explica Colaiacovo sobre como conseguiu realizar o sonho que alimentava há 15 anos de abrir um espaço sobre a história do cinema da Boca do Lixo.
O curador lembra, inclusive, que mesmo antes da chegada do crack, já havia uma população marginalizada naquelas ruas. “À época da boca, do cinema, tinha um respeito mútuo com a marginalidade, a prostituição, o crime. O cinema aqui era uma coisa cara, que todo mundo respeitava: não ia vir aqui alguém assaltar as atrizes porque o negócio ficava feio”, lembrou Colaiacovo, que foi assistente de Mojica por 15 anos.
“Quando o cinema acabou na Boca do Lixo, nos anos 1990 no Brasil, o Zé ficava recortando revista, recortando paisagens, juntava com coisas dos cartazes dele, xerocava, pintava com canetinha. Fez um trabalho de artes plásticas”, explicou o curador sobre as obras que compõem o acervo da família do artista, que morreu em 2020, aos 83 anos.
Influência internacional
Os filmes feitos com baixo orçamento de Mojica não só marcaram a história do cinema nacional, mas são referência do gênero em outras partes do mundo. Uma das filhas do cineasta, Liz Marins, lembra que o renomado diretor norte-americano Tim Burton, nas vezes que esteve em São Paulo, se encontrou com o criador do Zé do Caixão e manifestou sua admiração pelo trabalho do brasileiro. “Papai foi uma das referências do Tim. É muito forte isso, porque o trabalho do Tim é maravilhoso também”, disse Liz.
Criatividade exemplar e de berço
O primeiro estúdio do criador do Zé do Caixão foi um galinheiro adaptado. De acordo com Colaiacovo, foi lá que Mojica fez seus primeiros filmes amadores na década de 1940. Ele era conhecido por produzir em seus filmes cenas e efeitos que custariam muito mais do que os recursos que tinha disponíveis. O curador da exposição conta que, desde cedo, Mojica – filho de artistas circenses espanhóis – esteve em contato com a arte e com o cinema, até por esse ter sido um dos negócios do pai. “O pai e o tio eram toureiros e artistas. Eles estimularam muito o Mojica desde pequeno. Quando compraram o cinema, eles moravam nos fundos”, conta Colaiacovo.
‘Além, Muito Além do Zé do Caixão’
A exposição ‘Além, Muito Além do Zé do Caixão’, com um passeio pela trajetória cinematográfica de José Mojica Marins por meio de objetos, trechos de filmes, cartazes e colagens, pode ser vista no recém aberto Bar Soberano (Rua do Triunfo, 155 – Santa Ifigênia), adaptado como espaço cultural e cinema de exibição de filmes em película. A visitação pode ser feita de quarta-feira a sábado, das 10h às 16h, sempre com entrada gratuita.
Fonte: Daniel Mello/Agência Brasil
Foto de topo: Rovena Rosa/Agência Brasil
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