Primeiro Mundo é São Paulo Feliz

O cinema vive com a abstenção da realidade, o sentimento de fuga, esquecendo tudo que acontece fora daquela caverna mágica. Aprendemos a assistir filmes dessa forma, sentar, esperar, ver, ouvir e fim. Infelizmente aprendemos também a assistir a vida real como uma fantasia qualquer.

É o que anda acontecendo em São Paulo, o povo desaprendeu a viver.
O que você faz cinco dias da semana? Acorda já atrasado, gritando com a máquina por ter te despertado, mesmo que essa seja sua função primária; come alguma coisa requentada; toma um leite desnatado; pega o bilhete único; sai no frio, o céu ainda escuro; corre atrás do ônibus; tenta ficar em pé enquanto o motorista brinca de montanha russa; recebe um golpe da catraca, que foi empurrada com muita força pela pessoa que passou antes de você; luta para entrar em algum vagão de metrô; é molestada durante a viagem; chega atrasado no trabalho; vai almoçar, a fila para pagar sempre demora muito, então você é obrigado a comer em alguns poucos minutos; a internet funciona mal, o que atrasa a entrega de algum relatório; você retorna pra casa.

Tudo de novo, metrô, ônibus, catraca, frio, casa. Já é tarde, você está completamente esgotado. Toma um banho, come alguma coisa e dorme.

Sério? É sério que vocês estão bem com essa rotina? Eu sei que tem gente que acredita que a vida é realmente uma espécie de espiação dos seus erros antes de nascer (vai entender), mas estou aqui para te dizer que esse seu dia está completamente errado.

Haddad, o prefeito tranquilão, já anunciou os mirantes com café na Paulista; as ciclovias, que para muita gente significa a única chance de fazer exercício no dia, além de chegar aos lugares mais rápido; o fechamento da Paulista para carros aos domingos e mais um monte de delícias como essas.
O objetivo é fazer o paulistano entender que isso tudo está errado. A vida não deve ser assistida como um filme. Você não pode ver tudo passando pelo vidro do seu carro, do metrô ou do ônibus. Já passou da hora dessa cidade se humanizar.

Entenda, você trabalha mais do que quase todos no país e sabe pra quê? Para enriquecer alguém que mora em Miami! Então não há porque perder sua vida inteira em nome da fortuna de outro. Trabalhe, estude, mas não esqueça de viver. A cidade está aí para ser provada, testada, vivida. Ao invés de comprar um carro, você deveria ter viajado mais. Ao invés do investimento na bolsa, você podia investir em um curso em um intercâmbio. Ao invés do dinheiro extra, você podia apostar mais nos momentos novos de felicidade.

Acho que a exemplificação perfeita do que eu quero dizer é a quarta-feira. Ninguém é feliz na quarta. Ninguém está de bem com a vida no meio da semana. Os bares parecem cemitérios, a internet fica amarga, o Twitter explode em reclamação. O paulistano se habituou a esperar o fim de semana para ser ao menos contente. Aliás, o brasileiro se acostumou a esperar a velhice para, talvez, encontrar algum conforto em uma vida de penitência e esforço.

Tem gente trabalhando para que essa seja uma cidade do futuro, o tal do primeiro mundo. Entendo quem se apega agressivamente ao método antigo, ao “sofrimento devido”. Mas quando o amanhã chegar, todos vamos viver em uma cidade feliz, dessas da Europa, e até mesmo quem gostava do jeito antigo vai curtir um passeio com a família na Avenida Paulista, vazia de motor e lotada de amor.

Leonardo Sapucaia, estudante de cinema e jornalismo. Gosto de quadrinhos, séries, games e obviamente cinema. Vivo entre roteiros de cinema e textos jornalísticos, mais um do que o outro. Super orgulhoso de ser um nerd das antigas.

Sobre o autor

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